Protegendo o território.

— Ah, capoeira! A arte brasileira da guerra. — Ele diverte-se com uma gargalhada enquanto despe-se de seu figurino de fazendeiro e fica apenas com roupas básicas que usava por baixo. — Claro. Qualquer coisa que quiser ensinar aqui vai ser ótimo, todos precisamos de coisas para fazer. A velha Grusha dá aulas de imitação de pássaros para uma turma de três alunos, então literalmente qualquer ideia é boa.

As pessoas, com seu relógio biológico, já entendem que é o fim do dia. Pouco a pouco dirigem-se para os fundos dos escombros daquele ônibus espacial aonde ficaria a região dos assentos. Com o couro reaproveitado desses bancos, criaram camas improvisadas de sobra.

— Eu vou anunciar para todos pela manhã e você pode começar a sua turma amanhã, mas sugiro que descanse.

O nascer do sol em Phax está muito mais barulhento nessa manhão. Isso devido a uma espaçonave tripulada que carrega o símbolo da Aliança, voando cada vez mais baixo. Esta que acabou de ser apedrejada ao passar por Shinar, por uma população ainda desgostosa com o tiro na meretriz que ocorreu no dia anterior e que ainda não confia na presença da Aliança.

Seu destino é o meio do nada, a quinze quilômetros da capital planetária. O lugar seria só mais um monte de areia se não fossem os destroços já deteriorados de uma grande nave abatida muito tempo atrás, que agora serve de abrigo para um pequeno grupo de heróis que atua no planeta. Autodenominados "Milícia do Povo", eles se empenham em impedir os abusos tanto da Reconquista quanto da Aliança. Não possuem lado político e apenas prezam pela segurança dos pobres e necessitados, mas são comandados por um experiente veterano aposentado do exército da Aliança.

E é este que os recebe, com um rifle tático preso à correia e um binóculo em mãos. A maior parte do grupo ainda está dentro dos destroços onde vive, incluindo Frederick - o mais novo membro. É impossível, porém, continuar dormindo com o barulho que uma nave daquelas faz.

Alguns deixam a "moradia" para observar o veículo que pousa lentamente. Seu tamanho é de uma nave de carga, mas seu design e tecnologia permitem um voo extremamente rápido. Tecnologia que se vê uma vez na vida quando você mora num lugar paupérrimo como o planeta Phax.

Ele carrega a maior ajuda humanitária que a Aliança pode oferecer em pé de guerra: toneladas de alimento, equipamento para a extração de água no solo e o médico mais popular do momento.

— Cruzes, Frederick. São seus amigos? — Balbucia Tan, embasbacado com o tamanho do veículo.

— Sinto que seja os reforços que o meu capitão requisitou. Mas... É... A aliança é exagerada, eu sei, haha! — dizia o terráqueo que, por ironia, falava sobre exageros mesmo tendo olhos de esclera negra e íris amarela.

Ele então chegava um pouco perto de Sergei. Caso Tan não acompanhasse, iria se despedir com um aceno de cabeça.

— Parece que poderemos realizar uma doação das grandes, hein.

Seu tom, aparentemente debochado, poderia cruzar com o preconceito – embora muitas vezes justo – que muitos possuíam com a Aliança e gerar um pouco de discórdia. No entanto, Frederick dizia aquilo com real altruísmo e vontade à benevolência, o que poderia confundir ouvidos e cérebros alheios era exatamente o preconceito recém citado.

— Eu não duvido da Aliança, rapaz. Duvido de pessoas. — Murmura o soldado aposentado, tentando não se entusiasmar demais com os recursos trazidos. — Foi você quem pediu por isso? Saiba que não vamos acobertar absurdos dos seus soldados por causa de um rango, Fred.

Uma porta abre-se em frente do único que iria ficar: Renard. Os grandes contâiners com suprimentos são ejetados, e parece que o médico é a única recepção que teriam. Seria mais fácil se ele ao menos lembrasse dos termos que aceitou cumprir ali.

— Tenha certeza de que não querem nada em troca por mim, eles são seus amigos. Não tenho nada a oferecer por isso tudo.

— Eu também duvido, senhor, não se preocupe, não sou cego pelo objetivo da organização — ele dizia isso, mas sempre tentava ver o melhor nas pessoas. Era quase impossível ter algum preconceito e tentava sempre tratar a todos bem.

Assim que o médico chegou, não importando se era um soldado ou até mesmo com uma patente menor, Frederick realizou uma reverência militar. Rapidamente pôs seu dedão colado à testa com sua palma aberta.

— Cabo Frederick Jafari se apresentando, senhor! — ele dizia, logo em seguida, ignorando o fato de que Sergei parecia uma criança desconfiada do que um soldado do exército. Parecia não saber ler ninguém e/ou situações e, por isso, duvidaria até mesmo se um cão lhe entregasse uma bolinha para ele jogar — Permita-me requisitar informações sobre a sua presença, senhor?!

— Meus tempos de soldado acabaram há muito tempo. — Sergei interrompe, fazendo questão de deixar aquilo claro. É quase como se fazer parte da Aliança fosse um símbolo de fraqueza para ele agora. — Mas de repente a Aliança começou a trabalhar conosco, pelo jeito. Vocês precisam perdoar a minha desconfiança, mas entendam que estamos aqui há duas décadas, e Shinar está abandonada há quase um século.

Ele junta-se a Frederick e analisa o doutor. Depois de uma bela olhada ele estende sua mão num gesto amigável, mas mantém o semblante sério.

— É conveniente vocês aparecerem depois de pegarmos alguns soldados querendo se aproveitar de pessoas miseráveis, mas estamos dispostos a tentar fazer essa coisa dar certo. Só precisamos de um tempo para nos acostumar.

Os outros milicianos juntam-se ao redor para ver Renard. iormashianos são sempre curiosos e raros por ali, visto que é uma raça acostumada a acumular riqueza e raramente metem-se em situações como aquela.

— Ele é um novo membro da Milícia do Povo? — Indaga alguém da multidão, curioso.

— MILÍCIA DO POVO! — Exclamam todos em uníssono, seguindo o talvez irritante ritual de sempre destacar o grupo.

Frederick não grita em conjunto à seus companheiros, mas fecha o punho e o ergue um pouco acima do ombro. Queria participar, mesmo achando aquilo extremamente ridículo. Assim como Sergei, precisava de um tempo para se acostumar.

— Sem querer ir contra ou desrespeitar ninguém, não acho que três soldados tenham o valor deste tanto de suprimentos. Três soldados mortos acontecem em poucos segundos numa guerra, e ainda mais capturados? Se o escalão deles fossem alto o bastante para importar a captura, acho que este planeta não existiria mais... — Frederick, repentinamente, soava sério demais. Ninguém seria capaz de notar, mas era um claro desabafo à sua situação.

Com uma pequena "traição" fora mandado para a detenção por muitos meses e mesmo sendo cabo há um bom tempo de vida, nunca ouvira grandes segredos e, principalmente agora, sabia menos do que muitos soldados pelos boatos que corriam e não chegavam na sua cela.

— Mas, enfim — tentou ele arrumar sua postura, abaixando sua cabeça por alguns segundos e arranhando a garganta antes de voltar a olhar pra frente — não posso dizer o quão conveniente isto é, pois até pouco tempo eu não sabia nem da existência da miséria deste local, para mim era um planeta como qualquer outro, não importando há quantos séculos ele esteja desta forma — ele continuava. De repente, esticou seu braço para chegar ao ombro de Sergei. Deu duas batidas leves com a sua palma da mão, espalhando um pó desértico por todo o ar.

Estranhamente, não disse nada. Parecia não encontrar palavras para reconfortar a estranheza que o velho sentia com a ajuda repentina. Isto lhe deixava pensativo por poucos segundos, mas não havia como continuar os pensamentos naquele momento, pois precisava conversar com seu novo e médico companheiro.

— O senhor é um médico, certo, senhor Queenston? Então vai ter bastante trabalho por aqui, haha! O que acha, Sergei? — ele dizia, rindo e com um sorriso mostrando os dentes. Virou seu rosto para Sergei, pois sabia que ele era a maior patente do local e não de acordo à Aliança, mas sim de acordo ao local mesmo. Pela Milícia do Povo, ele era o líder, então iria respeitar sua vontade sempre, mesmo achando injusto algumas coisas que fazia. No entanto, isto não fazia com que evitasse discussões ou não falasse sua opinião, sempre foi presente e irritante para os líderes neste sentido, já que era participativo até demais em alguns momentos de decisão – apesar de não falar quando sente que está tudo no controle.

Enquanto Sergei respondia ou pensava em algo, Frederick acessava os canais de SIDA em busca do nome Renard Queenston. Queria saber o que ele era, o que ele fez rapidamente. Aparentemente, as palavras e desconfiança de Sergei atingiram Frederick, mesmo que minimamente. Havia também o motivo de que queria ver o quão habilidoso era o médico à sua frente, já que não podia ser qualquer médico a ser mandado em um planeta decadente, tendo em vista que um médico de guerra mandado à um país teria que ser extremamente qualificado em diversas situações e não só na área da saúde, imagina um médico de guerra que fora mandado à um planeta em decadência. Era uma escala muito maior e isto preocupou Frederick logo de início; "Um médico só? Não é possível, a Aliança não deve ligar mesmo para esse planeta", pensou ele no meio segundo antes de SIDA entregar-lhe as respostas mentalmente.

— Seja bem vindo à Milícia do Povo, doutor Q. — Começa Sergei, limpando a garganta.

— MILÍCIA DO POVO! — Exclamam todos em uníssono novamente, repetindo o ritual que parece não ter um limite, mas dessa vez acompanhado com um cumprimento de cada um.

— Acredito que pareça óbvio, mas esse grupo foi criado com a intenção de proteger o povo de Phax, que estavam completamente esquecidos. Como você certamente notou, a qualidade de vida aqui é péssima. — Suspira, variando seu olhar entre Renard e Frederick por um momento. — Mas realmente precisávamos de profissionais da saúde aqui, Fred. Mesmo sendo um só, acho que já é um começo. Talvez possa ensinar algumas coisas por aqui também. Mas já aviso, não vai ser fácil. Espero que sua fama seja algo bom, doutor Q. — Finaliza, dando de ombros. Não tem notícias desse tipo há tempo o suficiente para nunca ter ouvido falar no nome do Iomarshiano.

Ele parece pensativo após a última pergunta da raposa, levando sua mão ao queixo por um momento apenas. Provavelmente não a procura de um caso, visto que não devem ser poucos. E sim, tentando organizar seus pensamentos para decidir por onde o médico deveria começar. Por fim, decide que talvez ele deva começar tratando da Milícia do Povo por dentro, para que eles possam ajudar aos outros assim e o trabalho do médico seja expandido futuramente.

— Dois de nossos membros mais jovens tem péssima saúde, vivem doentes. — Ele diz em tom mais baixo, para que os mesmos não ouçam. — Os "adotamos" quando eram muito pequenos, mas a vida desses garotos foi bastante dura e eles nunca parecem estar bem. Sabe como é, infância conturbada, falta de alimento e poluição. Quer dizer, provavelmente você não sabe como é, mas a questão é que eles nunca melhoram realmente. — Explica, olhando na direção de dois garotos sentados no final da sala. Eles são Jhayesianos e parecem gêmeos, além disso, estão claramente doentes por sua aparência. — E infelizmente não temos utensílios médicos. Você é o primeiro que aparece por aqui. Talvez encontre por aí, mas com certeza vai ter que esterilizar.

Após os cumprimentos dados, encarava ambos falando. Não queria atrapalhar, mas queria ajudar com dicas pois só assim teria sua voz ouvida para mudar este lugar para o melhor.

— Podemos criar grupos de expedição para acharmos utensílios médicos e outro grupo para a esterilização. Parece que viemos aqui pra agitar tudo, hein, Sergei, vou te mostrar que eu estava certo! Haha! — ele dizia, dando pequenas cotoveladas no senhor na frase final. Estava tão concentrado em lembrar de falar aquilo para brincar com Sergei que esqueceu de reagir ao ritual da Milícia do Povo.

Então, para agilizar, foi até os Jhayesianos que pareciam ser os que foram citados. Dificilmente iria errar quem era vendo que sua percepção não era algo de falhar. Sendo assim, chegou na frente dos pequenos e se agachou.

— Oi — dizia o negro com um enorme sorriso, tentando ser amigável — nosso amigo ali que chegou agora é um médico muito famoso, ele vai ver como vocês estão para tentar ajudar vocês de vêz, tudo bem?

Os gêmeos se entreolham com a aproximação do homem. Seus olhos parecem cansados, emoldurados por olheiras tão profundas e escuras que são como manchas nas peles jovens e albinas, que por si só parecem ainda mais claras e até um pouco esverdeadas pela doença. Ainda assim, parecem ter no máximo dez anos. 

Já conhecem Frederick apenas de vista, mas jamais pensariam ser notados ali, no meio de tantos outros órfãos muito mais saudáveis e prestativos do que eles próprios. De fato, eles ainda não parecem ter percebido o motivo do destaque que estão recebendo.

— Oi moço — Diz o gêmeo da esquerda como se também falasse aquilo pelo irmão, mas sem muita animação.

— Obrigado — O da direita completa, engolindo em seco.

— Você acha que poderemos ficar bem? — Questiona o da esquerda, por fim.

Enquanto isso, Sergei se mantêm à distância para terminar a conversa com o médico. Ele observa ao longe a conversa entre Frederick e os meninos, mas em algum momento volta seu olhar para Renard mais uma vez.

— Isso seria bacana da sua parte, mas os meninos precisam ser curados primeiro. Sabe, eles tem sempre a mesma coisa, talvez até já tenham nascido com isso. Já ouvi de casos parecidos, mas ninguém sabe o que essa coisa é. — Ele dá de ombros, fazendo notas mentais sobre os sintomas. — Vivem com febre, vomitam sempre e por isso mal conseguem comer. Em alguns dias parecem melhores e ficam mais animadinhos, mas logo pioram tudo de novo. Bom, acho que eles podem te explicar melhor essa parte. Mas se puder cuidar deles antes, seria muito bom. — Pede.

Logo, um dos membros do grupo se aproxima com um papel na mão, parando perto do mais velho para cochichar algo em seu ouvido. Ele para e ouve o recado do garoto e, por fim, acena com a cabeça para mostrar que ele compreendeu o que foi dito. Assim, volta-se para Renard mais uma vez.

— Preciso dar uma palavrinha com Frederick, mas fica a vontade. — Ele dá alguns tapinhas no ombro do Iomarshiano antes de andar na direção do humano e limpar a garganta para chamar a atenção do mesmo. — Posso falar com você em particular Fred? Precisamos  que faça algo. — Ele pede, enquanto sorri e acena abobado para as crianças como se fosse mais novo do que elas.

— Se eu acho? — disse Frederick, em uma risada alegre, pondo ambas as mãos na cabeça dos garotos, ou seja, a mão esquerda no garoto esquerdo e a direita no garoto direito — É claro que eu não acho! Eu tenho certeza! — falava ele, animado. Seu tom subira um pouco e isso poderia chamar atenção, sendo até mesmo um recado indireto para ajudarem ele a animar os pequenos.

— Hm? — disse ele, enquanto ainda estava ajoelhado e fora requerido por Sergei — É claro — complementou, enquanto se erguia novamente.

Assim que Sergei saísse, iria acompanhá-lo, não esquecendo de acenar levemente com um sorriso para os gêmeos e verbalizando silenciosamente "tchau!".

Sergei começa a acompanhar Frederick, mas o chamado de Renard faz com que o mesmo interrompa seu caminhar e vire-se para a raposa. Ele escuta o pedido, parando para pensar e processar as informações por alguns minutos enquanto aproveita para coçar a cabeça já calva por conta da idade avançada.

— Hum... Tudo bem, eu acho. Rei? Hahaha, não é nada disso. Todos aqui são como meus filhos, doutor Q. Mas eu não entendo bulhufas de medicina, então faça do jeito que achar melhor. — Ele faz menção de se virar para voltar a conversar com o negro, mas se lembra da última pergunta. — Bom, pode escolher qualquer lugar, contanto que já não esteja ocupado. Fica a vontade.

Dessa vez, ele de fato se vira e continua o caminhar com o novo membro do grupo para tratar do assunto tão urgente. Ele para próximo a uma das paredes do cômodo e parece sério agora, mas não é bem definido se a situação é séria assim ou se ele apenas está tentando se lembrar do que deveria pedir.

— É... O que era mesmo? — Questiona para si mesmo, tentando se lembrar. — Ah, sim! Registramos mais um abuso de um soldado da Aliança no centro da cidade hoje de manhã. Um dos garotos viu e acabou de vir me contar... É o seguinte, Fred. Essa é a hora de você provar que é leal a nós. Esse cara foi visto batendo em um dos moradores de Shinar. Todo dia é mais um abuso para lidarmos, e precisamos que dê um jeito dessa vez. Você pode fazer isso? — Ele aguarda uma resposta, preenchido de expectativa.

— Sim, senhor. Com certeza — dizia ele sem pensar. Seus olhos brilhavam em seguida. Ele estava animado e ansioso para mostrar seu ponto.

Ele então olha para a multidão que estava ali, toda a milícia reunida.

— Posso levar o Tan? Talvez, mais algum outro, mas o Tan é quem eu mais conversei.

— Uh, ótimo. Claro, contanto que conclua a missão. — Sergei parece animado, caçando Tan com os olhos. Quando o encontra, acena em sua direção para chamá-lo. — Tan!

Ele aguarda a aproximação do rapaz, que o faz com prontidão para atender o chamado do líder. Seus olhos, entretanto, são curiosos e analisam o rosto dos dois presentes, aguardando.

— Fala, Paizão.

— Por favor, acompanha o Fred. Vocês vão dar um jeito naquele soldado pela Milícia do Povo! — Exclama Sergei mais uma vez, determinado.

— MILÍCIA DO POVO!!! 


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Os gêmeos se entreolham, achando muito exótica a aparência do Iomarshiano. Aos poucos, eles ficam menos apreensivos, começando achar a raposa até um pouco engraçada. Um leve sorriso surge nos lábios dos pequenos irmãos, já começando a se soltar. Ainda assim, eles parecem bastante desanimados.

— Oi doutor Q. — Começa o da esquerda.

— Acho que tem uma salinha vazia lá nos fundos. — Completa o da direita.

— Você pode fazer a gente ficar bem?

— Queremos ajudar o Paizão a cuidar de Shinar!


Um pouco mais animados, os meninos aceitam as mãos oferecidas em movimentos quase sincronizados. Eles guiam o médico para a sala mencionada por um dos irmãos, caminhando por um curto corredor até chegar em uma porta. Um deles a abre e revela uma sala vazia, mas pequena e até um pouco empoeirada, provavelmente pela falta de uso.

— Quer chamar mais alguém, Tan? Não conheço o pessoal tão bem quanto você — perguntou Frederick, como um bom amigo.

Era uma típica situação de quando se conhecia alguém que possuía muitos amigos, então sempre que saíssem juntos, iria acontecer a pergunta de se não quer chamar mais alguém, pois muitas vezes essas pessoas que tem muitos amigos tem eles justamente por serem presentes.

— Se não quiser, vamos só nos dois, não tem problema — terminou ele, com um sorriso.

Caso Tan não chamasse ninguém, iria ir na direção falada por Sergei.

— Bom... querer eu quero, mas os outros guerreiros estão em uma missão de caça agora. Eu nunca vou porquê sempre destruo muita parte da carne comestível. — Ele leva a mão até a nuca, ligeiramente encabulado. — Mas é bom saber que vou ter alguma coisa pra fazer agora.

O jovem Haytok dirige-se a um canto próximo para apanhar seu machado e um pequeno cantil. Aquilo é tudo que costuma levar para suas tarefas que geralmente são ao lado da garota Iormashiana que abordou Frederick em sua chegada. Seria uma experiência nova agir ao lado de alguém que não representa o completo oposto de sua personalidade.

— Muito bom, vocês já parecem prontos! Quero saber se você têm culhões para atentar contra outro membro da Aliança, rapaz. Se tudo der certo, vou me sentir mais a vontade pra confiar em vocês! — Diz Sergei, repousando sua mão grande nos ombros do leonês. — Eu tenho uma motorista especial para levar vocês até a cidade, e já passei a ela os detalhes do problema. Ela está na caranga envenenada logo ali! Agora eu vou ajudar os meninos a arranjar um lugar pra colocar esse monte de coisa, sim? Ah, não voltem tarde porque teremos a gincana!

Um veículo se aproxima lentamente para que a dupla possa adentrá-lo, e uma Mistiimeriana jovem está o dirigindo. Quando está próxima o suficiente, os dois podem notar que ela não é uma motorista convencional. Não têm nenhum dos dois braços e está dirigindo com os pés.

As palavras de Renard, ditas para confortar as crianças e transmitir positividade passam-lhes a sensação planejada. Os gêmeos sorriem um para o outro, exibindo seus dentes pequenos e amarelados pela falta extrema de recursos e aparentando já estarem até mesmo muito desgastados por conta da doença.

— Acho que sabemos. — Começa o da direita, aquele que sempre inicia as frases.

— Tem uns depósitos com umas tranqueiras... — O da esquerda continua.

— E alguns são aqui perto. — Ele continua, como se fosse a coisa mais natural do mundo para os irmãos.

— Deve ter algumas dessas coisas que você precisa lá, né?


— É só limpar!

— Se o Paizão deixar podemos ir com você! — Finaliza o segundo irmão, animado.

— Tudo bem, então. Vamos fazer esse como um treinamento, se você passar dos limites eu te paro; eu acho! Hahaha! — dizia Frederick, amigavelmente enquanto chegava perto da motorista mistiimeriana.

Ele ia entrando na nave, esperando que não tivesse nenhum ritual de entrada.

— Oi; com licença; tudo bom? — dizia ele, enquanto entrava na nave e se arrumava em seu interior.